Ai
dos que ao mal chamam bem, e ao bem mal; que fazem das trevas luz, e
da luz trevas; e fazem do amargo doce, e do doce amargo! Isaías
5:20
“Cosmovisão”
é uma das palavras que são propagadas como sendo de grande
importância. Mas, como parece que tudo vai bem na vida sem a
necessidade de se depender dela, há a tentação de acreditar que
sua importância é superestimada. É verdade; passear com um amigo,
discutindo sobre isso ou aquilo, raramente ocasiona uma conversa
sobre os primeiros princípios da lógica ou de paradigmas éticos
concorrentes. Mas permita que esse passeio o leve
pela Blutstraße (estrada de sangue) até o Memorial
Buchenwald na Alemanha, e então as visões de mundo assumirão um
significado assustador. Buchenwald, juntamente com outros campos de
concentração durante a Segunda Guerra Mundial, fazia parte do
mecanismo de extermínio nazista dedicado a matar judeus, dissidentes
políticos, ciganos e outros “indesejáveis”. 4, 14:58; jo 2:19,
10:17 e 18).
Viktor
Frankl, sobrevivente do Holocausto, explica as origens desse
pesadelo: “Se apresentarmos a alguém um conceito de ser humano que
não é verdadeiro, podemos muito bem corrompê-lo. [...] Eu conheci
o estágio mais elevado dessa distorção em meu segundo campo de
concentração, Auschwitz. As câmaras de gás de Auschwitz foram a
consequência última da teoria de que o ser humano não é senão o
produto da hereditariedade e do meio, ou, como os nazistas costumavam
dizer, do ‘Sangue e Solo’. Estou absolutamente convencido de que,
em última análise, as câmaras de gás de Auschwitz, Treblinka e
Maidanek foram preparadas não em algum ministério [departamento] em
Berlim, mas nas mesas e nas salas de aula de cientistas e filósofos
niilistas” (Viktor Frankl, The Doctor and the Soul: From
Psychotherapy to Logotherapy [O Médico e a Alma: Da
Psicoterapia à Logoterapia]. Nova York: Random House, 1986, p.
xxvii).
É
por isso que a cosmovisão é importante. Ela pode moldar uma
realidade na qual a luz se torna escuridão, e a escuridão, luz; na
qual o mal é bem e o bem é mal (Is 5:20). É ingênuo e tacanho
explicar atrocidades simplesmente chamando os autores de “monstros”
ou algum outro epíteto desumanizador, sem entender por que as
pessoas executam determinadas ações. Muitos “monstros” da
história demostravam amor por sua esposa e filhos, contavam piadas
aos amigos, balançavam seus netos sorridentes e continuavam a se
levantar todas as manhãs para realizar as atrocidades do dia. É por
isso que as visões de mundo são importantes. E é por isso que a
resposta para a pergunta do salmista, “que é o homem, que dele te
lembres?” (Sl 8:4), deve sempre começar com: “Criou Deus, pois,
o homem à Sua imagem, à imagem de Deus o criou; homem e mulher os
criou” (Gn 1:27
Existe
alguma religião ou sistema filosófico que valorize a vida humana
mais do que a proposição do cristianismo de que os seres humanos
são amados e foram criados segundo a semelhança divina? Essa
verdade está vinculada à crença de que os cristãos, inclusive os
adventistas do sétimo dia, são, de certo modo, os protetores do
valor e da dignidade do ser humano e devem atacar visões de mundo
concorrentes, organizando uma visão elevada do que significa ser
humano.
Alguns
podem pensar que é uma ilusão de grandeza presumir que a dignidade
da humanidade precisa ser defendida no século 21. Mas o (pós)
secularismo tem dificuldade em fundamentar o valor humano objetivo
(ou qualquer coisa “objetiva”). Em um famoso debate entre o
apologista cristão Greg Bahnsen e o ateu Gordon Stein, alguém
perguntou por que “a Alemanha de Hitler” estava errada. Stein,
representando a posição ateísta, não poderia ter dado melhor
resposta ao dizer que o que Hitler fez foi contra o “consenso”
moral da civilização ocidental. Basicamente, ele estava errado
porque a civilização ocidental havia decidido anteriormente que
comportamentos dessa natureza (por exemplo, o genocídio) estavam
errados. Dentro dessa visão moral de mundo, se a decisão tivesse
tomado a direção oposta por algum motivo, tudo o que foi feito
pelos nazistas poderia ter sido facilmente considerado moral.
Lembre-se, Gordon Stein não é um propagandista nazista da década
de 1930. Ele é um estudioso americano judeu que participou de um
debate na Universidade da Califórnia, Irvine, EUA, no ano de 1985.
Observe que nem Stein nem os nazistas concordam com uma visão de
mundo que defenda o valor intrínseco da humanidade. O conceito de
Stein de moralidade determinada pela maioria tem tanta eficácia em
conter o mal quanto um tigre de papel. Por fim, quem apoia essa
cosmovisão moral concluirá logicamente que não há nenhuma
obrigação moral objetiva de acompanhar a maioria e fará “cada
qual tudo o que bem parece aos seus olhos” (ver Pv 21:2, Dt 12:8,
Jz 21:25). Não é de se surpreender que governos ou indivíduos
perversos vêm e vão; o que é desconcertante é que as visões
centrais de mundo que os moldaram ainda podem ser ouvidas “nas
mesas e nas salas de aula de cientistas e filósofos niilistas”.
Fonte:
https://mais.cpb.com.br/licao/os-olhos-do-senhor-a-cosmovisao-biblica/