terça-feira, 28 de julho de 2020

O DIA EM QUE CHOREI


Eu não chorei quando o médico disse para mim e para o meu marido que Kristi, nossa filha de dois anos, tinha – como suspeitávamos – uma deficiência mental.
Vamos, chore”, aconselhou gentilmente o médico. “Chorar ajuda a prevenir dificuldades emocionais sérias”.
Apesar de a imensa dor que eu sentia, não consegui chorar naquele momento, nem durante os muitos meses que se seguiam. Quando Kristi já tinha idade para ir à escola, nós a matriculamos no jardim de infância do colégio do nosso bairro. Ela estava com sete anos.
Eu achei que fosse chorar no dia em que a deixei naquela sala cheia de crianças de cinco anos. Fiquei na escola, vendo Kristi passar horas e horas brincando sozinha, uma criança “diferente” no meio de outras 20. Senti um aperto enorme no coração, mas nenhuma lágrima saiu de meus olhos.
Com o passar do tempo, coisas positivas começaram a acontecer com Kristi e seus colegas de classe. Quando se vangloriavam de suas proezas, os colegas de Kristi sempre tinham o cuidado de elogiá-la: “Kristi escreveu todas as palavras certas hoje.” Ninguém acrescentava que os exercícios dela eram mais fáceis do que os dos outros. Os avanços de Kristi eram registrados com alegria pela turma.
Foi no segundo ano de Kristi na escola que ela enfrentou sua experiência mais desafiante.O grande evento do final de ano era uma competição, o ponto culminante das atividades de educação física. Kristi estava muito atrás da turma em coordenação motora. Meu marido e eu temíamos aquele dia.
No dia do evento, Kristi fingiu que estava doente. Eu fiquei extremamente dividida, tentada por um lado a deixá-la em casa, mas também consciente de que seria importante para ela vencer o medo. Com um nó na garganta, levei uma Kristi pálida e relutante até o ônibus da escola e me preparei para assistir à competição.
Sentada no meio dos outros pais, sentia meu coração bater forte. Quando chegou a vez de Kristi, eu entendi o que a preocupava. Sua classe estava dividida em times de revezamento. Com suas reações desengonçadas, hesitantes e lentas, ela, com certeza, iria prejudicar o seu time.
No entanto, a apresentação foi correndo bem, até a hora da corrida de sacos. Cada criança tinha que entrar em um saco na linha de partida, pular até a linha de chegada, e fazer o caminho de volta sem sair do saco. Observei minha filhinha em pé, perto do fim da sua fila de companheiros, com uma aparência assustada.
Mas, quando se aproximou o momento de Kristi participar da corrida, ocorreu uma troca de lugares em seu time. O menino mais alto da fila foi para trás de Kristi e segurou-a pela cintura. Dois outros meninos ficaram um pouco à frente dela. Quando chegou a vez de Kristi, aqueles dois meninos pegaram o saco vazio e o abriram. O menino mais alto suspendeu Kristi e a colocou suavemente dentro do saco. Uma menina à frente de nossa filha pegou-a pela mão e a sustentou brevemente, enquanto Kristi recuperava o equilíbrio. E então lá foi ela, pulando, sorridente e orgulhosa.
Em meio às aclamações dos professores, colegas e pais de alunos, eu me afastei lentamente, agradecendo a Deus por aquelas pessoas calorosas e compreensivas que tinham tornado possível para a minha filha deficiente agir como seus semelhantes.
E então, finalmente, eu chorei.
Meg Hill

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