Desde
então começou Jesus a pregar, e a dizer: Arrependei-vos, porque é
chegado o reino dos céus. Mateus
4:17.
“A
vida acaba onde o ‘Reino de Deus’ começa.”
Nietzsche, Crepúsculo dos Ídolos, 30.
Nietzsche, Crepúsculo dos Ídolos, 30.
Um
dos textos mais estranhos na Bíblia Hebraica é Êxodo 24:8. Depois
de DEUS miraculosamente libertar o povo de Israel do Egito, depois de
DEUS cuidar do povo no deserto, depois de DEUS fazer conhecidas suas
“palavras”, Moisés ouve da boca de DEUS o que é conhecido como
“o livro da aliança”. Várias leis são estabelecidas visando o
futuro do povo e suas relações com as nações vizinhas, e no fim
desse discurso, em Êxodo 24:3, o povo responde positivamente ao que
DEUS estabelece com as seguintes palavras: “Tudo o que o Senhor tem
falado faremos.” Após essa afirmação, a aliança entre DEUS e o
povo é ratificada através de sacrifícios, e finalizado com um rito
atípico, que é quando chegamos ao texto estranho de Êxodo 24:8:
“Então tomou Moisés aquele sangue, e espargiu-o sobre o povo, e
disse: Eis aqui o sangue da aliança que o Senhor tem feito convosco
sobre todas estas palavras.” O sangue dos sacrifícios é aspergido
sobre o povo. Mantenha isso em mente.
N.
T. Wright no livro How
God Became king
identificou
bem um problema que ignoramos. Se fôssemos convocados a contar a
história dos Evangelhos de forma resumida, a história provavelmente
seguiria (como no Credo de Nicéia): “Jesus nasceu, Jesus viveu,
Jesus morreu, e Jesus ressuscitou.” Curiosamente, não é assim que
os Evangelhos (especialmente os Sinóticos) apresentam a história.
Wright argumenta corretamente que a idéia central dos Evangelhos é
falar sobre o Reino de Deus. E de fato, uma leitura rápida de Mateus
já mostra a ênfase de Jesus (e antes dele de João Batista) no
Reino. A primeira vez que Jesus faz um sermão ele parece dar
continuidade ao discurso de João Batista: “Arrependei-vos pois é
chegado o Reino dos céus.” (Matheus 4:17)
Toda
a vida de Jesus representava a realidade do Reino. A prática e
conduta de Jesus antecipava o Reino de Deus futuro, já no presente.
Ele curava porque no Reino futuro não haveriam doentes; Ele
ressuscitava mortos porque no Reino futuro haveria vida plena; Ele
revelava o Pai porque no futuro haveria um conhecimento maior da
realidade de DEUS. A vida de Jesus era uma antecipação do futuro no
presente, uma das características mais marcantes da realidade do
Reino agora. Porém, o caminho para o Reino requer morte. O
arrependimento e o batismo simbolizavam um recomeço, um novo
nascimento e uma nova história onde DEUS deixa de ser um personagem
paralelo nas nossas narrativas pessoais e passa a ser protagonista,
passa a ser Rei. Portanto, a morte antecipa nova vida. Jesus mesmo
indica que para seguí-lo, dentro da realidade do Reino, deveríamos
carregar nossa própria cruz, pois morte antecipa vida. Jesus também
diz que somente aquele que perder a vida encontrá-la-ia, pois morte
antecipa vida. O que Cristo faz por nós se torna o paradigma para
aquilo que Cristo faz através de nós. Ele morre na cruz para que
possamos carregar nossa cruz e fazer o mesmo. Ele perde a vida e a
encontra, para que nós também possamos perder a nossa vida para
encontrá-la, afinal: morte antecipa vida.
Kierkegaard
fala a respeito dessa morte como a morte que está “entre” o
ímpeto de morrer e a nova vida. O espírito só pode conceder nova
vida uma vez que morremos para esta, agora. E uma vez ocorrida esta
morte, não perdemos a vida por completo mas entramos num novo
patamar de existência: o Reino. A vida se esvai, sim, mas ela
recomeça no Espírito num plano de existência em que Jesus é Rei.
O Reino em Sua presença representa morte e vida.
Nietzsche
observou corretamente o primeiro passo, mas, como muitos, perdeu de
vista a realidade Bíblica do segundo movimento.
Moisés
lança o sangue do sacrifício sobre o povo ratificando a aliança
através do perdão dos pecados, mas ao mesmo tempo, para que o povo
viva uma vida marcada pelo sacrifício. O sacrifício passa a ser o
paradigma para a nova vida que deveriam viver. A morte antecipa a
vida. Como Adão e Eva outrora, nós, hoje, precisamos viver nossa
vida cobertos pelas vestes do sacrifício que nos purifica e que
serve como novo modelo de vida “sacrificial” que devemos viver
dentro do Reino.
Fonte/Base:
http://terceiramargemdorio.org/texto/141/
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