segunda-feira, 22 de agosto de 2016

# 89

E não hei de eu ter compaixão da grande cidade de Nínive, em que estão mais de cento e vinte mil homens que não sabem discernir entre a sua mão direita e a sua mão esquerda, e também muitos animais? Jonas 4:11

Dentre os livros proféticos, o livro de Jonas é um dos que mais está relacionado ao recurso literário da ironia.
Dentre a soma de ironias figura-se, por exemplo: 1) a ironia do homem de DEUS, o profeta, tentar fugir de sua incumbência; 2) a ironia dos marinheiros do navio no qual Jonas embarca, aparentemente terem mais temor a DEUS do que o próprio Jonas; e 3) a ironia do profeta de DEUS que se ira ao ver o povo se arrependendo.
Uma outra ironia que parece permear toda a narrativa apresenta a terra e seus habitantes não-humanos como testemunhas divinamente designadas e como agentes de juízo para o profeta.
Supostamente, o profeta deveria ser o mediador das mensagens divinas. Comumente é o profeta quem é capaz de sofrer por ver o mundo de maneira mais ampla, através da perspectiva divina. Contudo, no livro de Jonas, algumas criaturas designadas por YHWH como: o peixe (2:1); a planta (4:6) e o verme (7) tomam o papel do profeta. É como se as criaturas não-humanas, ocupassem o lugar de Jonas como mediador das mensagens divinas, tornando, assim, a ironia ainda mais aguda.
Por fim, esta ironia central quanto ao papel profético, parece relacionada ao que Jonas sabia que poderia acontecer caso obedecesse ao comando divino. Em Jonas 4:2 lemos: “E orou ao SENHOR e disse: Ah! SENHOR! Não foi isso o que eu disse, estando ainda na minha terra? Por isso, me adiantei, fugindo para Társis, pois sabia que és DEUS clemente, e misericordioso, e tardio em irar-se, e grande em benignidade, e que te arrependes do mal.”
Como ficaria a reputação de profeta de Jonas caso ele dissesse que a cidade seria destruída em 40 dias e ela não fosse destruída?
Aqui vemos uma sutileza no jogo de palavras em hebraico. O sermão de Jonas é: “Ainda quarenta dias, e Nínive será subvertida” Ocorre que a palavra traduzida como “subvertida”, הפך (hapak), pode significar “subverter” ou “derribar” (como no caso de Sodoma e Gomorra: Gênesis 19:21, 25, 29), mas também “reverter”, “tornar” ou “converter” (como em Jeremias 31:13, cf. Dt 23:5). Então, depois de 40 dias, Nínive seria subvertida ou mudaria de direção; em outras palavras, ela seria destruída ou convertida? Será que a profecia de Jonas se cumpriu ou não?
Independentemente das surpresas provocadas pelas ironias do livro de Jonas, vemos claramente que o anúncio de juízo é, na verdade, uma oportunidade de arrependimento.
Assim, ironicamente, o livro termina sem um fim. Após a planta que protegia o profeta do sol se secar, Jonas pede a morte a DEUS. Como resposta, DEUS diz:  “Tens compaixão da planta que te não custou trabalho, a qual não fizeste crescer, que uma noite nasceu e numa noite pereceu; e não hei de eu ter compaixão da grande cidade de Nínive, em que há mais de cento e vinte mil pessoas, que não sabem discernir entre a mão direita e a esquerda, e também muitos animais?”


Fonte: http://terceiramargemdorio.org/texto/89/

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