Amado,
desejo que te vá bem em todas as coisas, e que tenhas saúde, assim
como bem vai a tua alma. III João 1:2
Gostamos
de pensar que é fácil distinguir a medicina boa da ruim. Um grande
sistema de educação, licenciamento e regulamentação depende dessa
premissa simples. E ainda assim, talvez mais frequentemente do que
imaginamos, a boa e a ruim se misturam como creme e café, de maneira
quase impossível de separar.
Alguns
anos atrás, uma paciente que eu tratava foi admitida no hospital com
uma crise de asma, doença que sofria há tempos. Ela estava na casa
dos 50 anos, mas, ao contrário da maioria de nós que acumula
doenças ao longo da vida, estava se desfazendo das dela. Ela havia
sido uma jovem doente, nos últimos estágios da Aids e com as
infecções recorrentes normais para o diagnóstico.
Então,
lentamente havia melhorado. Seus vícios foram domados, as infecções
tratadas, e o HIV bem controlado. Agora, o que continuava era apenas
um persistente hábito de fumar e uma terrível asma.
Se
você vai ter dois problemas, esses são uma dupla particularmente
ruim. Não apenas há a óbvia questão de um piorar o outro, mas é
também uma combinação que deixa os profissionais da medicina
furiosos. Autodestruição pura, dizem de maneira arrogante.
O
especialista em pulmão de minha paciente a havia expulsado de seu
consultório anos antes, sob ordens de não retornar até que parasse
de fumar, murmurando para sua enfermeira que ela estaria morta muito
antes disso acontecer. Minha paciente ouviu o que ele disse e
realmente nunca voltou, apesar de ainda não estar morta.
Mas
esse não é o exemplo de medicina ruim desta história.
No
hospital, ela recebeu os tratamentos usuais para asma e, como sempre,
melhorou. Dois dias depois da admissão, estava pronta para ir
embora, ou pelo menos pensou que estivesse, até receber duas
notícias diferentes. Quando liguei para saber sobre sua saúde, ela
estava quase chorando.
"Eles
acham que eu tenho pneumonia. Querem que eu faça uma tomografia
computadorizada", disse ela.
Fiz
as perguntas de rotina. Ela não tinha sintomas de pneumonia.
Enquanto conversávamos, peguei os resultados de seus exames e
raios-X pelo computador. Nada ali mostrava que ela estava com
pneumonia. Mas em suas ordens, claro, alguém -- e eu sabia quem --
havia decidido que ela poderia ter uma pneumonia relacionada à Aids
e queria tratá-la por isso. A tomografia daria o diagnóstico.
Existem
poucas certezas na medicina, mas essa era uma delas: a paciente não
tinha pneumonia, não se todas as regras básicas que usamos para
avaliar e tratar infecções fossem respeitadas.
Eu
sabia, porém, que o médico impaciente que estava supervisionando
seus cuidados tinha a tendência de agir rapidamente e deixar de lado
essas regras. Suas ações eram governadas não pelas regras, mas
pelo puro temor de que ele poderia deixar passar alguma coisa e ser
processado. Ele fazia exames para tudo e tratava qualquer coisa em
uma tentativa aterrorizada de ter certeza absoluta de que tudo sairia
bem. Claro, ele sempre adotou esse tipo de abordagem, mas nunca
chegou a repensá-la.
Esse
tipo de cuidado médico, infelizmente nada incomum, é caro, ilógico
e estúpido – apenas ruim. Expõe o paciente a todos os tipos de
medos e riscos desnecessários e, no processo, quebra o orçamento
dos cuidados de saúde.
Mais
tarde, voltei para ver se conseguia resolver a questão, mas o quarto
da minha paciente estava vazio. Ela já havia ido para a sala da
tomografia, um desperdício total de tempo, dinheiro, energia
emocional e radiação.
E
foi isso que aconteceu:
Ela
não tinha pneumonia, nem um traço da doença. Nenhuma surpresa. Mas
estava com uma massa grande na parte de cima do pulmão esquerdo. A
paciente foi para casa naquele dia, como esperava, mas apenas depois
que um cirurgião a atendeu e pediu uma avaliação para o que
parecia um câncer de pulmão.
Um
mês depois o tumor foi removido. Era câncer. Seus exames desde
então -- ela os faz regularmente agora -- mostram que está bem.
Péssimos
cuidados médicos salvaram sua vida. Que tal?
Espere
um minuto, diria você. Os fumantes não fazem tomografias
rotineiramente para checar se têm câncer de pulmão? Não foram
cuidados médicos terríveis. Foi proatividade, cuidados médicos
visionários!
Exatamente,
e isso é uma parte do problema. Anos antes de a tomografia
computadorizada para a detecção do câncer de pulmão ser apenas
uma ideia, seria medicina ruim. Mas o tempo muda tudo. O pior cuidado
pode se tornar o melhor. Não é de se espantar que seja tão difícil
policiar nossa profissão, com as coisas mudando o tempo todo. É
mais fácil pedir para uma lâmpada de lava para se organizar.
E
esse não foi nem o fim da história. O aparecimento repentino de
outra doença fatal na vida de minha paciente deixou-a apavorada. Ela
estava tão acabada com a sequência de eventos que parou de fumar,
não toca em um cigarro há anos.
Assim,
um único episódio de incompetência médica salvou sua vida duas
vezes.
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Fonte:http://www.bol.uol.com.br/
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